No dia 29 de setembro de 2024foi realizada eleições legislativas na Áustria nas quais o partido de extrema direita Partido da Liberdade da Áustria, pela primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial, venceu uma eleição, ficando a frente do Partido Popular Austríaco e do Partido da social democracia (de centro-esquerda) e formou maioria no Conselho Nacional (que tem 183 assentos, com mandato parlamentar de cinco anos). Na eleição anterior, de 2019 o FPO tinha 31 representantes e agora elegeu mais 25 (e agora tem maioria, com 56). O Partido Popular, de direita, tinha 71 e caiu para 52. Os verdes também perderam, tinham 26 representantes e perderam dez, ficando agora com 16.
Na Alemanha na eleição realizada no dia 1 de setembro de 2024, o partido de extrema direita Alternative fur Deutschland (AfD, ou Alternativa para a Alemanha), venceu a eleição no Estado de Turíngia, no leste do país. Além disso, elegeu a segunda maior bancada no parlamento da Saxônia. Como afirmou Paul Kirby, editor da Europa da BB News em artigo publicado no dia 2 de setembro de 2024, é a primeira vitória da direita radical em uma eleição para parlamento estadual na Alemanha desde a Segunda Guerra Mundial, conquistando quase um terço dos votos, nove pontos acima dos conservadores do CDU, e muito na frente dos três partidos que formam a coalizão federal que governa a Alemanha.
A vitória eleitoral nesses dois países de partidos de extrema direita foi antecedida pela vitória eleitoral também em outros países e na eleição para o Parlamento Europeu realizada em junho de 2024, também houve um crescimento, sendo principalmente na Alemanha, França e Itália.
Na Alemanha em primeiro lugar, ficou a União Democrata-Cristã (CDU), oposição conservadora moderada, com 30% dos votos e em segundo, o partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD). O Partido Socialdemocrata (SPD) do chanceler Olaf Scholz, de centro-esquerda, ficou em terceiro lugar com 13,9%.
Na França, a extrema direita, representada pelo Reagrupamento Nacional de Marine Le Pen (foto) teve 31,37% dos votos, alcançando seu melhor desde sua formação com cerca de 1/3 dos votos, o dobro da votação do partido do presidente Emmanuel Macron, (Renascimento), que caiu de 31,4% obtido na eleição de 2019 para 14,6% (O Renascimento tem agora 270 dos 577 assentos do Legislativo).
Na Itália, o partido fascista Irmãos da Itália – que em outubro de 2022 elegeu a primeira-ministra Giorgia Meloni – foi o mais votado com 28,8% dos votos, seguido do Partido Democrático (de centro) com 24,1%.
Na Hungria, o Fidesz, de extrema direita ficou em primeiro lugar com 43.8% dos votos (embora com o pior resultado em 14 anos). Na Espanha, o Vox, também de extrema direita, que havia perdido força nas eleições gerais espanholas em 2023, conquistou 10% dos votos, elegendo seis deputados, e se tornando a terceira força no país no Parlamento Europeu.
No entanto, houve vitórias importantes para conter a onda fascista na Europa: o campo progressista conseguiu algumas vitórias como em Portugal (O Chega, de extrema direita, teve 9,8% dos votos e apenas duas cadeiras no Parlamento), na Finlândia, a esquerda superou a extrema direta, o Partido dos Finlandeses, que integra a coalizão do governo, hoje no poder. A Aliança de Esquerda teve 17,3% dos votos e a melhor votação desde 1979, ficando em segundo lugar atrás da Coalizão Nacional de centro-direita. O Partido dos Finlandeses perdeu uma cadeira, com sua votação caindo de 13,8% em 2019 para 7,6% em 2024.
Na Suécia os Verdes e o Partido da Esquerda avançaram mais do que a extrema direita (13,8% e 11%, respectivamente). Na França, embora a extrema direita tenha crescido, os partidos de esquerda (Partido Socialista, França Insubmissa e os ecologistas), somados, tiveram uma votação muito próxima: 29,22%.
Um aspecto relevante é que os moderados de direita e centro continuam com maioria, o Partido Popular Europeu (EPP), foi o grande vencedor das eleições, ampliando sua bancada em 13 assentos e chegando a 189 no total e é a força predominante no Parlamento Europeu com 458 deputados dos 720 membros. A extrema direita soma 134 cadeiras.
Outro aspecto que merece ser destacado nas eleições europeias é o uso que a extrema direita fez das redes sociais (que não é específico da Europa) e em especial discursos (de ódio) contra a imigração, que mesmo com suas diferenças internas, é o que as unem. No caso da União Europeia, em 2023, cerca de 380 mil pessoas atravessaram ilegalmente as suas fronteiras, o número mais alto desde 2016 e a extrema direita associou tem associado esse crescimento ao aumento da violência e da criminalidade.
Além da anti-imigração e a negação de serviços e direitos sociais dos imigrantes, propostas de fechamento de fronteiras, associadas à essência da extrema direita que são o autoritarismo, a intolerância étnica e a violência.
Em relação à eleição para o Parlamento Europeu realizado em junho de 2024, um dos desdobramentos do crescimento da extrema direita foi a dissolução do parlamento e convocação de eleições legislativas na França pelo presidente Emmanuel Macron com a realização de eleições em 30 de junho e 7 de julho de 2024, primeiro e segundo turno, respectivamente) e o resultado foi a derrota da extrema direita: o bloco de esquerda Nova Frente Popular elegeu 182 representantes, ante 168 da coalizão governista de centro e 143 da extrema direita.
No último dia da votação, milhares de pessoas se manifestaram no país em defesa da democracia e em Paris (na Praça da República) na manifestação que reuniu milhares de pessoas, uma das faixas dizia: “Fascistas às portas do poder. União já!”.
E assim foi feito. A França mostrou a importância da defesa da democracia, que é fundamental não apenas para a França, mas para todos os países, inclusive para o Brasil no qual a extrema direita, que tem crescido e a considerar as pesquisas que antecedem à eleição do dia 6 de outubro, pode crescer ainda mais nos parlamentos municipais.
Na França a esquerda representada pela La France Insoumise (rebelde), o Partido Socialista, os Verdes, o Partido Comunista, a Esquerda Republicana Socialista e o Movimento Geração, anunciaram um acordo para se unirem em uma frente popular contra a extrema direita, não para defender Macron e sim ter como objetivo “levar a cabo um programa de rupturas sociais e ecológicas para construir uma alternativa a Macron e combater o projeto racista da extrema-direita”.
Em 1848 foi publicado o Manifesto do Partido Comunista, escrito por Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895). No primeiro parágrafo eles afirmam: “Um espectro ronda a Europa – o espectro do comunismo. Todas as potências da velha Europa uniram-se numa Santa Aliança para conjurá-lo: o papa e o czar, Metternich e Guizot, os radicais franceses e os espiões da polícia alemã”.
Em 2024, o espectro que ronda a Europa não é mais o comunismo, mas o fascismo, expresso no crescimento eleitoral da extrema direita em vários países e faz parte do que o cientista político holandês Cas Mudde chamou de quarta onda da extrema direita pós-guerra que começa a partir de 2000 (as anteriores foram o Neofascismo, 1945-1955, Populismo de direita, 1955-1980, Direita radical, 1980-2000).
Os resultados eleitorais das eleições legislativas na Áustria e Alemanha e do Parlamento Europeu são os exemplos mais recentes, neste caso, com representantes de 27 países, e em torno de 185 milhões de eleitores, houve um crescimento da extrema direita em 18 países.
No livro A extrema direita hoje (publicado em 2019 e no Brasil em 2022 pela Editora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro) Cas Mudde afirma que uma característica da quarta onda – a que estamos vivendo – e que difere das anteriores, é que há uma naturalização e consolidação da extrema direita nos sistemas políticos: “O número de países nos quais a extrema direita é considerada aceitável em coalizões pela direita tradicional, e até mesmo por alguns partidos de esquerda, cresce cada vez mais”.
Outra característica é a sua heterogeneidade. Há países em que a extrema direita está mais consolidada e no poder, como na Polônia, Turquia e Hungria na Europa, Índia (Modi), Israel (Likud do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu) e Filipinas com Rodrigo Duterte, no poder desde 2016 e outras com líderes da extrema direita eleitos em eleições mais recentes como Donald Trump dos Estados Unidos (2017-2020), Jair Bolsonaro no Brasil (2019-2022) e Javier Milei da Argentina, em novembro de 2023.
E tem crescido eleitoralmente em países de larga tradição democrática como França, Holanda, Suécia, Alemanha, Dinamarca, Noruega e Finlândia, e também na Itália (o partido de extrema direita Irmãos da Itália venceu as eleições de setembro de 2022 e passou a ocupar a maior parte das cadeiras do parlamento e sua líder, Giorgia Meloni se tornou primeira-ministra), Grécia (na eleição de maio de 2023 a extrema-direita elegeu 34 deputados no parlamento mais à direita da Grécia nas últimas décadas), além do crescimento eleitoral de partidos fascistas na Espanha (Vox) e Chega! de Portugal.
A união é fundamental para derrotar a extrema direita onde o espectro do fascismo está presente. E as eleições de junho na França e no México (dia 2 de junho) mostram que isso é possível. No México com a vitória de Claudia Sheinbaum com 59% dos votos e 33 milhões de eleitores . A coligação vitoriosa Sigamos Haciendo Historia, foi composto pelo partido MORENA (Movimiento de Regeneración Nacional), Partido Verde Ecologista e Partido do Trabalho.
E isso é possível e vale para todos os países onde a extrema direita tem crescido, inclusive o Brasil. Segundo um levantamento da Action Consultoria, publicado no jornal O GLOBO (que teve acesso com exclusividade), os partidos de direita foram os que cresceram em número de candidatos na eleição de outubro de 2024, em relação à de 2020. O PL, PRTB e Novo lançaram 59.257 candidatos a prefeito (a), vice-prefeito (a) ou vereador (a), um índice 42% maior do que o registrado anteriormente (41.787).